Marco temporal ameaça principalmente os povos indígenas e a floresta, mas atinge a todos e todas ao violar o direito constitucional ao meio ambiente equilibrado
O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) repudia enfaticamente a aprovação do PL 490/07 na Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (30/5). Os 283 deputados que votaram a favor da proposta “passaram a boiada” sobre a Constituição Federal, atendendo unicamente aos interesses dos setores mais retrógrados do agronegócio e outros que devastam a floresta e agridem os povos indígenas.
Mais do que ameaçar a existência dos povos indígenas e da floresta, o PL 490/07 também viola o direito de todos/as os/as brasileiros/as ao meio ambiente equilibrado, em todo o território nacional. De autoria do deputado Homero Pereira (eleito pelo então Partido da República, atual PL), o projeto de lei altera o Estatuto do Índio (Lei nº 6.001 de 1973), restringindo a demarcação das terras indígenas àquelas comprovadamente ocupadas até 5 de outubro de 1988. Na prática, abrirá caminho para que invasores sejam considerados os verdadeiros donos desses territórios.
A tese do marco temporal tem sido defendida por setores e políticos ruralistas com o falso argumento de que ao não fixar uma data para a ocupação das terras pelos indígenas, a Constituição Federal trouxe insegurança jurídica e conflitos fundiários. Juristas, organizações indígenas, movimentos sociais e ambientalistas, no entanto, consideram a tese falaciosa, além de ser um retrocesso e uma afronta à dignidade e sobrevivência dos povos indígenas.
Fixar 5 de outubro de 1988 como data limite é como tentar apagar a história, como alerta a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). A organização lembra que muitas comunidades indígenas foram expulsas de suas terras durante a ditadura militar e só conseguiram retornar após a data reivindicada pelos defensores do marco temporal.
Em nota técnica, a Apib faz um alerta para outras consequências que a aprovação do PL 490/07 trará – liberação de construções de rodovias, hidrelétricas e outras obras em terras indígenas sem consulta livre, prévia e informada das comunidades afetadas, “violando tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário como a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).”
O FNDC destaca o direito humano à informação como de fundamental relevância neste momento em que os setores mais atrasados da sociedade decidem intensificar sua política genocida contra os povos indígenas. É urgente que a sociedade compreenda os impactos nefastos do marco temporal. Os meios de comunicação independentes ampliam as vozes dos povos indígenas, dão visibilidade à sua luta pela direito de existir, mas o fazem em um cenário desfavorável de concentração de propriedade que não atinge a pluralidade e se resguarda num “isencionismo” que iguala o direito à vida ao direito de matar.
Enquanto os grandes meios de comunicação tradicionais e as plataformas da internet servirem como espelho dos interesses daqueles que exploram, matam e devastam, estaremos em desvantagem para defender o direito de existir de todos que não constituem as elites econômicas e financeiras.
Por tudo, nos situamos entre aqueles que ecoam a luta dos povos indígenas contra esse grave retrocesso e se articulam para estancar a iniciativa genocida em curso. Esperamos que essa tese infundada não prospere no Senado Federal e que o STF cumpra seu papel de defender a Constituição Federal, que no seu Art. 231 reconhece aos povos indígenas “os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.