Palestrantes da 25ª Plenária Nacional voltaram a defender políticas públicas de financiamento de projetos democráticos de comunicação, comprometidos com o interesse público e os direitos humanos
O Brasil ainda vive uma ameaça real de tomada pelo fascismo que precisa ser enfrentada também no campo da comunicação. Sem um projeto capaz de garantir a pluralidade e diversidade comunicacional, o campo democrático e as esquerdas não conseguirão enfrentar a extrema direita, cada vez mais ambiciosa, articulada em nível global e aliada às big techs. Essa foi a principal linha de raciocínio dos palestrantes da mesa “Jornalismo e comunicação popular como instrumentos para o fortalecimento da democracia”, que abriu a programação da 25ª Plenária Nacional do FNDC, neste sábado (29/6).
A mesa, mediada pela secretária de Comunicação do FNDC, Rita Casaro, foi composta por Samira de Castro, presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj); Altamiro Borges (Miro), do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé; e Geremias dos Santos, presidente da Abraço Brasil.
Para Altamiro Borges, “estamos vivendo um momento regressivo-destrutivo”. Ele lembra que a eleição presidencial dos Estados Unidos empoderará a extrema direita não só no Brasil, mas também no resto do mundo. “Na Bolívia, tivemos uma tentativa de golpe. A extrema direita desponta com força na Itália, França, Alemanha, com votações muito expressivas”, e que sem disputar a comunicação para fazer o debate público de resistência e combate ao fascismo, não há como vencê-lo.
Miro endossa a compreensão de que as esquerdas devem se unir para pressionar o governo por uma política pública estratégica de comunicação, e pontua que essa não é a única batalha contra a extrema-direita, mas que essa batalha é fundamental. “O Estado é indutor, se o Estado não induz, as coisas não acontecem, e se não pressionarmos, o governo não vai se movimentar. Precisamos intensificar a pressão por financiamento de mídias periféricas, pretas, de mulheres”.
Militante histórico da esquerda e da democratização da comunicação, Miro lembrou que em 2023 a Rede Globo ficou com 52% da verba de publicidade da Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom-PR), de R$ 600 mil. “Para onde vai esse dinheiro? Se tivéssemos 2% desse valor – R$ 12 milhões, faríamos muito. É preciso redistribuir essa verba e isso é parte de um projeto estratégico de comunicação para a o país”. Para Miro, fazer a pressão e forçar um debate público sobre democratização da comunicação não é garantia de vitória, mas é uma tarefa indispensável.
Interesse público
Samira Castro, presidenta da Fenaj, também defendeu políticas públicas capazes de sustentar um modelo de jornalismo comprometido com o interesse publico e os direitos humanos, principalmente nos chamados desertos de notícias. “Ainda temos 26 milhões de pessoas vivendo em desertos de notícias, que não existem apenas em cidades pequenas, mas também em grandes centros urbanos. Nesses locais, se não forem os comunicadores populares, as rádios comunitárias, a população não tem acesso à informação sobre seus próprios problemas”.
A jornalista lembrou que a Fenaj reivindica a criação de uma Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide) para taxar as plataformas digitais que se utilizam e lucram com o conteúdo jornalístico. Para a Federação, essa é uma das formas de financiamento de projetos de jornalismo capazes de cumprir seu papel social. “Temos muitas iniciativas sérias e competentes nos estados, que mesmo sem verba, enfrentam a precarização para produzir informação e debate de qualidade em muitas localidades e que sem financiamento correm o risco de deixar de existir”.
Relevância do rádio
Geremias dos Santos, presidente da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço Brasil) e secretário de Políticas Públicas do FNDC, chamou a atenção para a forma como a extrema direita se mobiliza por se apropriar e concentrar ainda mais a radiodifusão no país. “O rádio é ouvido por 83% da população. Três de cada 5 brasileiros ouvem rádio todos os dias e cada um ouve, em média, três horas e 58 minutos, ou seja, se o rádio fosse ultrapassado, a direita não estaria de olho nas concessões”, afirmou.
A lei 14.812/24, que amplia o número de concessões públicas de rádio e TV por titular, é um instrumento dessa estratégia. “Sem debater com a sociedade, o Congresso Nacional aprovou essa lei em regime de urgência para beneficiar os coronéis da mídia, que estão de olho no rádio digital e já garantiram novas concessões para concentrar ainda mais o setor”.
Geremias questionou qual é a compreensão dos movimentos sociais e dos partidos de esquerda sobre a comunicação no Brasil. “Parece que nenhum! Quantas centrais sindicais têm rádio e TV no Brasil?”. Ele retificou o alerta de que sem pressão, o governo não vai tomar iniciativa. “O que já reclamávamos lá na década de 80, e que deu origem ao FNDC, está pior, e vai piorar ainda mais se não tiver enfrentamento”.
Plenária Nacional
A 25ª Plenária Nacional do FNDC começou nesta sexta (28/3) e vai até o próximo domingo (30/6), com a participação de 12 comitês regionais. O público participa presencialmente, no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, e online.