O primeiro dia do Seminário Audiovisual e Territórios Populares da América Latina – Desafios e Perspectivas do Audiovisual foi marcado ontem por debates sobre cinema, educação e tecnologia e pela presença de jovens das periferias de São Paulo. O objetivo é oferecer uma ampla visão do esforço criativo de inúmeros roteiristas e cineastas latino-americanos, que buscam construir narrativas que possam ser a legítima expressão de culturas e povos que sempre ocuparam um lugar subalterno na grande indústria cinematográfica.
O evento, realizado no auditório do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, é promovido pelo Instituto Alvorada Brasil (IAB) em parceria com o coletivo Com.Unidades, com financiamento público via emenda parlamentar federal e patrocínio do Ministério da Cultura. Serão quatro encontros semanais, por três semanas, até 7 de junho.
A iniciativa concedeu 40 bolsas de incentivo a jovens de 18 a 30 anos, moradores de diferentes regiões periféricas da capital, que formaram um grupo diverso em origem, gênero, orientação sexual, cor e etnias. O público reflete a pluralidade cultural e social da cidade: estudantes, artistas, educadores e comunicadores em início de trajetória, que veem no audiovisual uma ferramenta de expressão e emancipação coletiva.
Já no primeiro dia o seminário provocou reflexões sobre a identidade brasileira. “Tínhamos um olhar estereotipado da nossa cultura e isso a gente não pode deixar acontecer”, afirmou a participante Jéssica (nome fictício)*, 21 anos.
O seminário foi aberto com a mediação do cineasta Max Alvim, que conduziu mesas temáticas reunindo profissionais do cinema, acadêmicos e participantes do coletivo Com.Unidades. Na primeira mesa, Narrativas do Audiovisual nos Territórios Populares da América Latina, o filósofo Rogério da Costa, o cineasta Lincoln Pires (Monomito Filmes) e a diretora Tatiana Lohmann discutiram o papel das periferias e dos povos latino-americanos na criação de novas linguagens e na desconstrução de estereótipos sobre a América Latina herdados do olhar colonial.
Na segunda mesa, Dificuldades e Caminhos para uma Educação Midiática,o professor Luiz Augusto de Paula Souza, o Tuto, da Faculdade de Ciências Humanas da PUC-SP, a jornalista Rosane Borges, também professora da PUC-SP, e a cineasta Lilian Solá Santiago abordaram o poder das imagens na formação crítica da juventude e o potencial do audiovisual como instrumento de escuta e transformação social. Santiago, pioneira entre mulheres negras no documentário brasileiro, emocionou o público ao defender o cinema como “ferramenta de cura coletiva”.
Encerrando o primeiro dia, a mesa Desafios do Presente e do Futuro na Produção Audiovisual trouxe: Admirson Medeiros, o Greg, secretário nacional de economia Solidária da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e ex-coordenador do FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação); Lucas Bambozzi, artista e pesquisador em mídias digitais; e Marcos Bastos, professor vinculado ao departamento de artes e ao programa de pós-graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital da PUC-SP. O trio discutiu os impactos da inteligência artificial e do ciberativismo no mundo do trabalho criativo.
Nos próximos dias, o seminário seguirá com oficinas formativas e dinâmicas colaborativas, que convidarão os jovens participantes a refletir coletivamente e formular percepções objetivas sobre os conteúdos de cada oficina, consolidando um processo de escuta, análise e síntese crítica das experiências vividas.
É mais um evento que consolida São Paulo como um polo de reflexão sobre o audiovisual do Sul Global – um cinema feito por e para quem historicamente esteve fora das telas –, mas agora com participantes que reivindicam o direito de narrar suas próprias histórias.
*Os nomes dos participantes foram alterados para garantir o caráter incógnito dos depoimentos por se tratar de pessoas em situação de vulnerabilidade social




