Elizângela Araújo
FNDC

Evento definiu quatro eixos para regulação das plataformas digitais: regulação econômica, de processos, soberania tecnológica e educação midiática

O Brasil deve construir uma regulação para as plataformas digitais que expresse as necessidades locais e não seja um espelho do que fez a União Europeia. Esse debate vai muito além do PL 2630/2020, que cria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, em tramitação no Congresso Nacional (o “PL das fake news”), e deve envolver os demais países da América Latina.

Essa articulação deve ter quatro eixos: regulação econômica, de processos (transparência nos algoritmos, responsabilização das plataformas para monitorar e remover discursos de ódio, fake news e desinformação, proteção de dados pessoais etc.), soberania tecnológica e construção de alternativas autônomas para a difusão de informação online, e educação para a mídia e a construção de alternativas e espaços de participação social de usuários.

Esses foram os principais consensos gerados no I Seminário Big Techs, Informação e Democracia na América Latina, realizado pelo Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, a Coalizão Diretos na Rede e o Fórum sobre Informação e Democracia (organização internacional que reúne 11 entidades de diferentes países e tem sede na França). O evento foi realizado em São Paulo, nesta terça e quarta (5 e 6 de dezembro), e reuniu representantes do governo e parlamento brasileiros, organizações da sociedade civil e pesquisadores do Brasil, Uruguai, Argentina, México, Paraguai, Costa Rica e França (entre as quais o FNDC).

Na região, o Brasil é o país em que esse debate está mais avançado. Temos o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e estamos discutindo o PL 2630. “Somos um país de dimensões continentais, então o que a gente aprova e discute aqui com certeza reverbera no restante do continente. Então, a ideia é que a gente possa realmente, a partir dessa movimentação, influenciar positivamente esses países a também constituírem legislações ou políticas públicas que estejam em linha com o respeito à diversidade e pluralidade e o direito à comunicação de um modo geral”, explicou Ana Mielke, coordenadora do Intervozes e secretária de Formação do FNDC.

A ideia é lançar, em 2024, um sumário executivo dos debates realizados no seminário para subsidiar os parceiros nos debates locais sobre os quatro eixos tratados no evento. Um segundo seminário deverá ser realizado para dar avanço à pauta, com local e data a serem definidos pelas organizações envolvidas.

PL 2630

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do projeto PL 2630/20, foi um dos participantes do primeiro painel. O parlamentar afirmou que acredita que “falta convicção política” sobre a importância da regulação das big techs para a própria democracia. Para ele, a aprovação da matéria não encerra a luta por melhorias no combate à desinformação e ao monopólio das big techs. “Não é o PL 2630 que vai estabelecer parâmetros para as plataformas digitais, o Marco Civil da Internet e a LGPD já fazem isso. A própria Constituição Federal é um parâmetro. Além porque sabemos dos limites do PL. Então, para mim, essa regulação em uma obra aberta”.

Silva também falou sobre a urgência do financiamento da produção e difusão da informação. “A Fenaj Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) defende a tributação das big techs, há quem defenda fundos públicos, há quem defenda acordo de cooperação entre big techs e empresas (jornalísticas). Há muitas possibilidades, mas eu considero central para a garantia do acesso à informação que na nossa agenda coloquemos na mesa alternativas para financiar produção e difusão da informação”.

Educação para a mídia

O secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, João Brant, também participou da primeira mesa. Segundo ele, uma proposta de financiamento será apresentada pelo governo nas próximas semanas a instituições como a Fenaj e a Associação de Jornalismo Digital (Ajor).

Brant disse que o governo federal está usando o poder de chamamento que tem, e citou medidas para o combate à desinformação, como a educação midiática. “Tivemos a primeira semana de educação midiática com 403 atividades em 24 dos 27 Estados, em parceria com quem já constrói isso no dia a dia e com secretarias estaduais e municipais de Educação”. Ainda segundo ele, o governo está fechando uma proposta de educação em tempo integral que inclui a educação para a mídia. “A meta é formar 300 mil professores em educação midiática no Plano Plurianual (PPA)”, informou.

O secretário também destacou a recente declaração conjunta com a Alemanha sobre o combate à desinformação e ao extremismo e reforçou o fato de o Brasil ter trazido recentemente para o G20 o debate sobre a integridade da informação. Alguns participantes criticaram o fato de o governo não estar conversando com a sociedade civil organizada nos movimentos sociais sobre essas agendas.

Debates estão disponíveis

Os debates abertos ao público foram transmitidos pelo YouTube, nos canais do Intervozes e da Coalizão Direitos na Rede. Acesse pelos links abaixo.

 Mesas 1: Experiências de regulação de plataformas na América Latina e a elaboração de uma agenda regional para o tema: PL 2630 e outras iniciativas legislativas

– Mesa 2: A construção de alternativas autônomas para a difusão de informação online e a soberania tecnológica (adiante o vídeo para 3:00)

– Mesa 3: Regulação econômica das plataformas digitais: como resolver a ausência de pluralidade e de diversidade de informação e os repetidos abusos de poder econômico

– Mesa 4: Educação para a mídia e a construção de alternativas: como empoderar e fomentar espaços de participação social de usuários da América Latina para a melhoria do ambiente digital (adiante o vídeo para 2:24)